Desde a literatura clássica, o ciúme sempre foi tratado como um combustível para o amor. O dramaturgo espanhol Antonio García Gutiérrez escreveu que "a paixão morre de frio quando não há ciúme", enquanto Lope de Vega, ainda no século XVI, definiu o sentimento como "filho do amor, mas ilegítimo".
A ideia, segundo estes e outros autores de sucessos, seria de que uma pontinha de ciúme manteria o desejo amoroso aceso. O problema é que, fora da poesia, essa emoção costuma caminhar em uma linha tênue e perigosa, entre o alerta emocional e o comportamento tóxico.
Na vida real, o ciúme geralmente nasce do medo da traição ou da desconfiança após experiências de infidelidade, considerada por muitos a ferida mais dolorosa de um relacionamento. O escritor Fernando Sabino resumiu bem esse sentimento ao dizer que "infidelidade é como ser sócio de alguém e roubar dinheiro do caixa".
A quebra de confiança, especialmente quando vem de quem divide a intimidade do dia a dia, deixa marcas profundas e difíceis de apagar.
Mas será que o ciúme pode funcionar como um radar para detectar traições? Um estudo publicado em 2022 pelos pesquisadores Menelaos Apostolou e Ioulia Antonopoulou sugere que sim. A pesquisa, feita com mais de 900 participantes na República de Chipre, mostrou que pessoas com níveis mais altos de ciúme tinham maior probabilidade de perceber infidelidades do parceiro.
O levantamento também analisou traços de personalidade como abertura, conscienciosidade (organização e disciplina), extroversão, amabilidade e neuroticismo, que significa instabilidade emocional e representa uma tendência de sentir ansiedade e emoções negativas com mais intensidade.
Os dados chamam atenção, já que mais da metade dos entrevistados afirmou já ter sido traída ao menos uma vez. Curiosamente, quem passou por essa experiência demonstrou maior capacidade de identificar sinais de infidelidade em relacionamentos seguintes.
Segundo os pesquisadores, isso pode acontecer porque o estado constante de alerta faz com que essas pessoas observem comportamentos com mais atenção, indo além do óbvio. Já indivíduos menos ciumentos, geralmente mais abertos e tolerantes, tendem a confiar mais, o que diminui a vigilância e, consequentemente, a chance de descobrir uma traição.
Ainda assim, especialistas fazem um alerta importante: embora o ciúme possa até funcionar como um detector de mentiras e consequentemente de traições, ele também aumenta conflitos e desgasta a relação entre o casal.
Psicólogos reforçam que esse sentimento costuma ser confundido com amor, quando na verdade está muito mais ligado à insegurança, dependência emocional e baixa autoestima, algo mais próximo da posse do que do afeto, como aponta a Top Doctors ES. No fim das contas, o ideal é chegar a um consenso: um pouco de ciúme pode até servir como sinal de alerta, mas em excesso ele cobra um preço alto demais.
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