A morte de Preta Gil, aos 50 anos, por complicações de um câncer, foi a segunda perda de filho encarada por Gilberto Gil. A primeira foi em 2 de fevereiro de 1990, quando seu filho Pedro morreu nove dias após sofrer um grave acidente de carro no Rio de Janeiro.
Pai de oito - saiba aqui quem é quem na família de artistas -, o cantor e compositor foi ao "Programa Livre" (SBT) no final de setembro de 1991 e falou da sua relação com Deus, garantiu não ter como o Criador lhe causar decepção e fez uma reflexão a respeito da morte.
"É um mistério tão profundo", analisou Gil. "Decepção com Deus não é possível. Deus não decepciona. Deus é tudo. As decepções são por nossa conta", prosseguiu o parceiro musical de Caetano Veloso.
Na atração de Serginho Groisman, Gil se debruçou sobre as mais variadas religiões e povos "Todas as religiões oferecem o seu Deus ou os seus Deuses como promessa para depois da morte. As religiões cristãs falam no céu, no inferno, no purgatório. As outras dizem assim. Os índios imaginavam isso e aquilo. Os primitivos da África imaginam de tal maneira. Tais religiões, os orientais imaginam de tal forma...", listou o músico.
"Acho que o que quer que a gente imagine, a gente ainda corre o risco de ter a surpresa de não ser exatamente a maneira como a gente imagina. É tão misterioso, tão interrogação, é tão concreto o fato de que ninguém voltou de lá, ninguém aqui entre nós já esteve lá depois da morte e voltou para nos dizer exatamente como é, que a gente não sabe como é. Então será nada, nada, nada, nada do que eu possa imaginar", opinou (vídeo nesta matéria).
Em conversa com a plateia adolescente, o avô de Francisco Gil refletiu ainda sobre o Criador: "Se Deus é uma pessoa e se foi Ele quem criou tudo, Ele criou tudo que nos decepciona também". "Então, já é parte. A gente não pode... Deus é antes da gente, então a gente não pode se decepcionar...", garantiu o músico, que durante o tratamento de Preta contra o câncer teve uma franca conversa com a filha sobre vida e morte.
"Ele já deixou a decepção no mundo como parte dos instrumentos para trabalhar a vida", opinou o compositor de quase 800 músicas, com destaque para "Aquele Abraço", "Palco" e "Expresso 2222". E no programa de Serginho Groisman, o veterano fez uma pergunta à uma jovem do auditório. "Você acha que na música 'Se Eu Quiser Falar com Deus', eu estou reclamando de Deus"?, questionou o artista.
E a estudante citou os dois últimos versos ("Nada, nada, nada, nada/Do que eu pensava encontrar") da canção. "Mas não é mesmo, porque Deus é um mistério. Eu acho que a gente imagina Deus, fantasia de todos os modos... Tem todas as religiões que atribuem a Deus qualidades essas, aquelas e tal. Mas na verdade, a grande, a mais profunda ideia de Deus está associada ao depois da vida. Está associada à morte, ao mistério da morte", disse.